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Livro tece narrativas sensíveis sobre a tragédia-crime da Vale em Brumadinho

Valdir de Castro Oliveira

Em emocionantes relatos de um dos comandantes do Corpo de Bombeiros, Anderson Passos, juntamente com Luciana Quierati, através do livro “Brumadinho 272 –, que é o relato de um dos comandantes dos bombeiros sobre as buscas e as vidas impactadas pelo desastre da barragem” (Editora 11Letras, 2023, 319 páginas).

Os dois autores do livro descrevem a tragédia-crime da Vale em Brumadinho que aconteceu no dia 19 de janeiro de 2019 quando a barragens de rejeitos de minério dessa empresa se rompeu no Córrego do Feijão matando 272 pessoas, as nossas joias, como as chama corretamente a Avabrum, incluindo neste número dois nascituros, além de causar incalculáveis prejuízos econômicos, ambientais, sanitários e psicológicos à população no município e em boa parte da Bacia do Paraopeba.

Oficialmente foram 270 mortes, mas faz parte da luta dos familiares das vítimas dessa tragédia e Avabrum incluir nela dois nascituros, Maria Elisa e Lorenzo que estavam ainda nas barrigas de Eliane de Oliveira Melo e de Fernanda Damian de Almeida, respectivamente. Nessa tragédia eles tiveram seus futuros ceifados mesmo antes de nascerem somando-se à assim à dor e ao luto das outras famílias que até hoje choram por seus entes queridos.

Com uma linguagem clara, bem ritmada e, em alguns momentos poética, através desse livro, os dois autores vão revelando os bastidores e o drama dos bombeiros diante desta tragédia-crime desde o primeiro dia em que foram acionados para prestar socorro às vítimas aqui em Brumadinho. Em relatos emocionantes eles descrevem os dilemas que tiveram de enfrentar e os gestos de solidariedade e de esperança que emitiam para a população ou as rápidas decisões que se viam instados a tomar diante de determinadas situações na urgência de salvar pessoas ou encontrar o que delas restou diante de milhões de litros de lama tóxica que escorreram no palco dessa monumental tragédia-crime.

Mas, à medida que tecem seus relatos, neles os rostos e os perfis humanos dos bombeiros vão se avultando e desvelando suas características humanas, a relação com os companheiros e suas respectivas famílias e, principalmente, com o encantamento que nutrem pela profissão. E nos sugerem que, para uma pessoa ser bombeiro, ela deve ser detentora da nobre capacidade de estender a mão para o outro, tanto no sentido literal quanto no sentido cristão, pois é deste tipo de gesto que eles reiteram o seu amor pela vida do próximo mesmo que, muitas vezes, correndo o risco de perder a sua própria vida.

Mas, para além dessa solidariedade profundamente cristã, eles devem conhecer em profundidade as técnicas para deter ou amenizar os efeitos do curso de uma tragédia salvando pessoas, animais, debelar incêndios, inundações ou evitar que alguém tire a sua própria vida.

São os heróis anônimos que muitas vezes só conhecemos quando ouvimos as sirenas dos seus carros entoando seus cânticos cruzando céleres as ruas afora no cumprimento de mais uma de suas missões.

Mas raramente vemos seus rostos!

Mas em Brumadinho os gigantescos efeitos da tragédia-crime provocados pela Vale foi de tal monta que muitas vezes pudemos vê-los de perto em carne e osso ou pela televisão, internet ou mesmo apertar a mão de alguns deles testemunhando de como eles varavam os dias e as noites voando em seus helicópteros ou atolados na lama estendendo as mãos com o intuito de salvar pessoas e animais ou simplesmente abraçando e consolando pessoas em situações dramáticas.

Nem sempre eles conseguiam falar ou descrever o que estava acontecendo, tanto por falta de tempo quanto por falta de palavras para descrever o horror do que estavam diuturnamente a testemunhar no palco dos acontecimentos, principalmente para a mídia.

Diante disso foi designado o tenente dos Bombeiros, Pedro Aihara, hoje deputado federal, para falar por todos durante a missão e que, assim, se tornou simbolicamente o rosto e o porta-voz das operações em curso ou concluídas e seus respectivos resultados.

E, entre um fato e outro, os autores do livro vão desvelando a dramaticidade que envolveu a ação dos bombeiros e de outras pessoas e corporações tanto na organização das operações de resgate e salvamento de pessoas quanto sobre as rápidas decisões que tinham que tomar para que suas missões tivessem êxito.

Mas também tiveram de lutar muito contra curiosos ou voluntários afoitos que, sem coordenação, podiam comprometer os seus trabalhos que tinham de ser precisos e coordenados entre várias equipes e instâncias, pois qualquer erro ou vacilo colocaria em risco a gigantesca operação por eles desenvolvidas.

Assim, além dos problemas em si dessa missão, eles tiveram de lidar com dezenas de voluntários e de curiosos que invadiram o espaço da tragédia.

E, de quebra, ainda coordenar o trabalho de centenas de bombeiros de vários estados, inclusive uma delegação de Israel, que vieram para ajudar.

E no burburinho dessa tragédia-crime os dois autores do livro vão citando nomes e desvelando a dimensão humana que os bombeiros tiveram de enfrentar e os vivos, os feridos ou os mortos que iam encontrando no decorrer dessa gigantesca operação para resgatar pessoas e ao mesmo tempo expressar gestos e palavras de solidariedade aos parentes de suas vítimas.

E é emocionante observar através desse livro de como aos poucos o nome e o perfil humano desses bravos soldados de uniformes alaranjados vão se desvelando ao leitor e mostrando o sofrimento deles ao escarafunchar cada metro quadrado de lama para salvar uma pessoa ou de lá retirar um cadáver.

É confortável também saber de como aos poucos eles desvelam a metodologia de trabalho dos bombeiros e que, embora muito bem treinados, nem sempre eles têm o necessário tempo para tomar decisões diante de certas situações com que se defrontam.

Nestas situações, ficamos sabendo de como na maior parte das vezes eles têm de agir rápido e intuitivamente se querem salvar vidas ou evitar que certas situações ocorram.

E aos poucos este livro vai desvelando muitas dessas situações e de como cada um desses heroicos bombeiros ganha rosto e nome, assim como a dor e o dilema que os acompanhou diante dessa gigantesca tragédia-crime que aconteceu em Brumadinho.

Agradeço aqui aos meus cunhados, Jean Gonçalves e Flávia Mucelli, por me trazerem um exemplar desse livro autografado pelos dois autores, já que não pude comparecer pessoalmente ao lançamento.

Estou acabando de ler e recomendo a todos a sua leitura.