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A coragem de escrever sobre a vida e de ser você mesmo

Paulo Fonsêcà

Eu sempre penso que escrever por si só já é um ato revolucionário. Pode se escrever sobre tudo; criar pessoas, mundos, falas, discussões, problemas com soluções reais ou imaginárias. Não existe limitação para a escrita, porém, escrever sobre si mesmo para mim ainda continua sendo o ato mais revolucionário.

Esse mês em passeio a Livraria Mega Morais me deparei com ninguém menos do que Abdellah Taia. Abdellah é um escritor e cineasta marroquino que escreve em francês e mora em Paris desde 1999. Autor de oito romances fortemente autobiográficos. Seus livros foram traduzidos para basco, holandês, alemão, inglês, italiano, português, romeno, espanhol, sueco, dinamarquês e árabe, aqui no Brasil sai pela Editora Nós os brilhantes: “Aquele que é digno de ser amado”, “Um país para morrer” (ambos disponíveis na Livraria e comprados por mim) e ainda o mais recente lançamento “Viver à sua luz”.

Outra coisa que eu também penso é que nenhum encontro é por acaso. O encontro com Abdellah não foi apenas na livraria e na leitura. Esse mês o autor marroquino estava no Brasil e veio conversar sobre sua literatura em Belo Horizonte e, é claro que eu fui. Daí pra frente uma sucessão de fatos engraçados e curiosos.

Convidei para ir comigo dois amigos queridíssimos: Leísa Amaral e Aline Mangaraviti, fomos muito empolgados em um dia de semana pela manhã parar no outro lado do mundo (popularmente conhecido como a Pampulha em BH) para conversar com nosso brilhante escritor. Na data já tinha devorado seus dois livros e amado a sua literatura, apesar de marroquino Abdellah escreve e fala francês, como o evento era ministrado pelo consulado francês no Brasil fomos na ilusão da conversa ser mediada e ter algum tipo de tradução simultânea, mas, mera ilusão…

A conversa foi apenas em francês mesmo, (risos e lágrimas). Leísa fala e entende francês perfeitamente já eu… Apesar de falar português, espanhol, inglês e alemão não, eu não falo francês, meu amigo Aline também não, rimos muito e entendemos nada? Só que não! Daí vem a coragem de escrever sobre a vida. Como já tínhamos lido seus livros e falamos outras línguas como citado, ainda tínhamos outro ponto a nosso favor, o universo de escrita do autor é também sobre o nosso universo vivenciado, a potência de escrita do mundo LGBTQIA+ (universo no qual eu e Aline também pertencemos), exatamente por isso conseguimos entender, debater e levantar diversos questionamentos.

Os conflitos do Marrocos apresentado pelo autor. As relações familiares e amorosas de uma pessoa LGBTQIA+. O Racismo social. Os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade impostos pelos franceses. A capacidade de inventar e se reinventar na escrita. Foi muita coisa aprendida. Impressionante como a escrita aproxima até quando às vezes a comunicação verbal se torna quase que impossível.

Ao fim da conversa a maravilhosa amiga Leísa ainda mediou nosso encontro com Abdellah tornando o diálogo possível e ainda mais engrandecedor. Não tenho dúvidas, literatura transforma!

Por mais encontros na vida e na literatura. Leiam Abdellah, brilhante e necessário.

 

Na foto (esq. Para direita): Leísa Amaral, Aline Mangaraviti, Paulo Fonsêcà e a frente Abdellah Taia.